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ORÇAMENTO DO ESTADO PARA 2020
Encerramento
06 de fevereiro de 2020
Discurso do Deputado Rui Rio
Senhor Presidente,
Senhor Primeiro Ministro,
Senhoras e senhores Membros do Governo,
Senhoras e senhores Deputados,
Como tive oportunidade de afirmar neste plenário há 3 meses atrás, “mais do que no seu Programa, é, acima de tudo, nas propostas de Orçamento do Estado que vamos entender a realidade e as opções da ação governativa (…) será em sede de Orçamento do Estado que melhor se aferirá o caminho que esta governação tomará.”
Assim é, efetivamente.
O Orçamento do Estado para 2020 procura enquadrar-se na realidade virtual de um país cor-de-rosa que o nosso dia-a-dia não consegue vislumbrar.
Aposta num caminho de continuidade que abraça com particular carinho a gestão da conjuntura e despreza uma visão reformista, capaz de fazer a nossa economia crescer e, dessa forma, garantir, a médio prazo, melhores condições de vida a todos os portugueses.
Um orçamento que não tem, por isso, uma estratégia económica subjacente. Tem medidas que procuram agradar aqui e acolá, mas não tem um rumo e um objetivo concreto no horizonte. Não encerra, em si mesmo, uma estratégia sólida de governação.
Não podia, aliás, esta realidade ser muito diferente, em face da conjuntura politico-parlamentar que continuamos a viver.
Não há casamento de papel passado, mas também não houve a coragem de consumar o divórcio entre as partes. Vivemos uma situação politico-conjugal, em que arrufos e ameaças convivem com carinhosos piscar de olhos e pequenos lanches à mesa do orçamento.
Assim sendo, como era de esperar, o debate na especialidade não alterou na sua substância estrutural nada de muito relevante da proposta original do Governo.
Continua, por isso, a não corresponder ao que o PSD entende como necessário para o futuro do País, tal como aqui detalhamos aquando do debate na generalidade.
Não acreditamos na promessa de que se vai executar em 2020 o investimento público que, até agora, nunca se executou.
Não nos iludimos quanto à capacidade de reorganizar os serviços públicos, apesar do Governo dar a entender que, agora, tudo vai ficar melhor.
Sabemos que em 2020 os portugueses vão pagar ainda mais impostos do que já pagavam em 2019, por mais que o Governo e, em particular, o seu Ministro das Finanças torture os números e a semântica.
Sabemos, também, que não há medidas capazes de dinamizar a poupança e de fomentar a competitividade externa, para assim combater o nosso elevado endividamento face ao exterior.
Senhor Presidente,
Senhoras e senhores Deputados,
O PSD não está sozinho nas críticas a esta proposta de Orçamento.
Para além de um desagrado razoavelmente generalizado de diversos setores da sociedade portuguesa, grande parte das nossas críticas foram confirmadas e revalidadas por diversos organismos e entidades credíveis que, no quadro das suas funções, analisaram a proposta de Orçamento para 2020.
Refiro-me ao Conselho das Finanças Públicas, à UTAO, à Comissão Europeia e ao insuspeito Eurogrupo, liderado pelo próprio Ministro das Finanças de Portugal.
É precisamente o Eurogrupo e a Comissão Europeia que alertam para os riscos de incumprimento das regras comunitárias, em especial no que toca aos objetivos de consolidação orçamental de médio prazo, avisando para possíveis “desvios significativos” no ajustamento do saldo estrutural.
Para fazer face a estes riscos, o Presidente do Eurogrupo pede ao Ministro das Finanças português para considerar atempadamente a adoção das “medidas adicionais necessárias” - ou seja, Mário Centeno em Bruxelas duvida da eficácia de Mário Centeno em Lisboa.
Já a UTAO, entre outros reparos, é muito clara ao dizer que o conceito de carga fiscal utilizado pelo Governo na proposta orçamental não corresponde ao usado pelo INE e por Bruxelas.
Os técnicos do Parlamento não têm dúvidas: se forem usados os mesmos conceitos – e passo a citar – “o aumento da carga fiscal em 2020 subjacente à proposta de orçamento afigura-se ainda maior". Não ficará nos 35,1% do PIB que o Governo refere, mas, sim, nos 35,4% … "o patamar mais elevado da história recente", como sublinha a UTAO.
Como se vê, bem pode andar o Governo a baralhar os portugueses com jogos de palavras à volta da carga fiscal, que a verdade vem sempre ao de cima.
Também o Conselho de Finanças Públicas comunga da visão do PSD ao afirmar que o Governo tem andado, sobretudo, ‘à boleia’ da conjuntura, pouco mais fazendo do que aproveitar o ciclo económico favorável e a política monetária do Banco Central Europeu.
E mesmo referindo-se ao superavit de 0,2%, como um “progresso do comportamento orçamental global” (que o PSD também valoriza), aquela entidade não deixa de apontar “uma evolução praticamente nula do saldo primário estrutural”.
Mas, Senhor Presidente,
o Conselho de Finanças Públicas não se ficou por aqui e também se referiu ao misterioso caso dos 590 milhões de euros que ora aparecem, ora desaparecem dos quadros do orçamento socialista, numa inaceitável falta de transparência como temos vindo a denunciar.
Diz o Conselho que a “discricionariedade” do Governo, ao usar um saldo orçamental que varia consoante a página do Relatório que lemos, é excessiva, indesejável e que “não tem enquadramento legal”.
Palavras educadas – contrastando, aliás, com o estilo do Sr. Ministro Mário Centeno – mas seguramente palavras bem claras quanto à falta de transparência orçamental.
Resta ao Sr. Ministro das Finanças jogar o seu às de trunfo que é, nada mais, nada menos, do que dizer que os outros não percebem nada disto e que ele é que sabe da coisa.
Pode, aliás, nesse fantástico argumento incluir o próprio presidente do Eurogrupo que, pelos vistos, também não deixou de o criticar.
É, aliás, curioso, como o Sr. Primeiro-ministro referiu, aqui neste Plenário há menos de um mês atrás, que estes 590 milhões de Euros eram coisa pouca e sem importância, face ao volume total de despesa pública; eram uns meros 0,6% dessa despesa.
Pois bem, essa declaração foi feita pelo mesmo Primeiro-ministro que, à boca das eleições europeias, ameaçou com uma demissão teatral, por causa de uma verba que, nas suas estrambólicas contas, atingia 600 milhões de Euros.
É ainda o mesmo Primeiro-ministro que, nos últimos dias, nos voltou a brindar com afirmações de toque melodramático, a propósito da redução do IVA da eletricidade.
Nem numa situação nem na outra se aplica a insustentabilidade financeira, porque em ambos os casos o equilíbrio estava garantido. Mas aqui o importante é perceber-se que para o chefe do Governo português, 590 milhões é muito pouco; mas 600 milhões já pode ser tanto que até merece que se leve à cena uma peça do jeito “Agarra-me, senão eu demito-me”.
No caso concreto do IVA, menos de um terço da aludida bagatela de 590 milhões de Euros pode ser, afinal, mais grave do que a própria bagatela.
Senhor Presidente,
Senhoras e senhores Deputados,
Não cabe ao maior partido de oposição apresentar um orçamento alternativo ao do Governo. Nunca aconteceu, não faria sentido, nem a oposição tem meios para tal. A apresentação do Orçamento de Estado é prerrogativa e responsabilidade dos Governos.
Temos, por isso, consciência de que não nos cabe apresentar todas as propostas estruturantes que decorreriam da aplicação do nosso programa eleitoral. Tal procedimento não seria correto.
Mas se isso é verdade, também não deixa de o ser, apresentar algumas propostas que possam, à luz do nosso entendimento, melhorar objetivos que consideramos estrategicamente relevantes.
À cabeça da nossa preocupação está naturalmente a redução da carga fiscal, na medida em que o desenho orçamental apresentado o permite - porque, em caso algum, o PSD porá em causa o equilíbrio alcançado.
É esta a marca das nossas propostas, ao contrário do que disse o Sr. Ministro das Finanças, com as suas contas delirantes e o seu discurso muito pouco cuidado.
No quadro da redução da carga fiscal marcou este debate a nossa proposta de redução do IVA da eletricidade de 23 para 6%, exclusivamente para o consumo doméstico. Das diversas reduções de impostos que prevíamos no nosso programa foi esta a que emblematicamente escolhemos para acomodar num Orçamento que não é o nosso.
Sensíveis ao debate parlamentar, ajustamos a proposta, de molde a ir de encontro às reservas que os outros partidos iam colocando e acreditando que estavam todos a falar sem máscara e de boa-fé.
Adiamos a entrada em vigor da redução do imposto para o dia 1 de outubro, centrando a contrapartida exclusivamente nos exagerados gastos dos gabinetes ministeriais e no ajustamento do superavit orçamental para rigorosamente 0,2% do PIB.
Nem assim a proposta mereceu a aprovação do PS e do Governo. Uma proposta sensata que permitia ao Governo cumprir o que prometeu na carta que enviou a Bruxelas, e ao PS ser coerente com o Projeto de Resolução que aqui apresentou em 2013 com a assinatura do seu atual Secretário de Estado da Energia.
Permitia, também, ao PCP não servir de muleta, ajudando um Governo que, nesta matéria, já caminhava com notória dificuldade.
Um PCP que diz que quer baixar o IVA se for desde já. Porque se for só a partir de outubro, já prefere que ele não desça nunca.
Para os comunistas, que tanto gostam de falar no nosso povo, o que este costuma dizer nestas circunstâncias, é que “se isto tem alguma lógica, então eu vou ali e venho já”.
Nunca o País tinha visto um PCP a contradizer-se de forma tão atabalhoada e tão desajeitadamente servil aos socialistas.
PS e PCP saem deste debate com o IVA da eletricidade no escalão máximo como afinal sempre desejaram. Mas saem inevitavelmente de cabeça baixa perante o que andaram a dizer e a prometer.
Senhor Presidente, senhoras e senhores deputados
Por estes episódios e por todas as razões aqui reafirmadas durante o debate, o PSD votará contra a proposta de Orçamento de Estado para 2020, na plena convicção de que era possível fazer mais e, acima de tudo, muito melhor, por Portugal e pelos portugueses.